Comentário: O Debate Entre João Soares e o Embaixador Interino de Angola



Há muito que me escuso de ver conversações políticas televisivas, porque concluí serem um entretenimento para as massas. Mas decidi ver o programa 360, transmitido na RTP3, no qual supostamente ir-se-ia assistir ao confronto de ideias entre o ex-ministro da Cultura João Soares e o embaixador interino de angola, o professor António Luvualu de Carvalho: que fraude!

Os caros leitores bem podem imaginar o assalto à inteligência perpetrada por aqueles dois indivíduos. Não sendo eu professora, nem política com ou sem experiência, não me vou perder no lamaçal da papagaiada mas faço notar que João Soares como se dizia em Moçambique esteve “assim assim, luís angola” enquanto que o honourable acting ambassador esteve tal qual uma catatua doida.
 
Entre os dois marxistas-leninistas, a conversa foi tipo “crítica e reconciliação no interior da  Internacional Socialista” - por pouco não sucumbi a um ataque epiléptico:
  • O pobre do embaixador, perante o ineficaz ataque da não-democracia por parte de João Soares, só teria que dizer que o conceito é inconclusivo e de certa maneira sobrevalorizado.
  • O João Soares se não tem aferrado em demasia na defesa da democracia, direitos, garantias e liberdades não teria caído na racionalização simplista e até descontextualizada de factos ocorridos noutros países, que foram citados pelo embaixador interino.
  • Para o embaixador, o regime ditatorial do seu país é um mito - João Soares deveria ter dito que os portugueses viveram 50 anos envoltos num mito idêntico ao da actualidade angolana, que por acaso terminou na revolução dos cravos, beneficiando também Angola que conheceu assim o fim do colonialismo. 
  • O embaixador alega que os presos políticos em Angola ou são elementos subversivos ou caluniadores e a alegação de que houve cidadãos bárbara e vilmente assassinados pelas forças de segurança no seu país, são afirmações gratuitas pois nada ficou provado - João Soares deveria ter respondido que a PIDE-DGS respondia de igual modo no Portugal antes de 1974
  • O embaixador alega que não reconhece validade aos índices que critiquem Angola nem sequer subscreve nenhum relatório que contraria o pensar do MPLA - João Soares se não estivesse tão concentrado em puxar os seus galões de sabichão, teria calmamente dito que duvidava de igual modo dos dados sobre saúde, educação, pobreza, iliteracia, sonhos esboçados no papel sobre a industrialização de Angola divulgados pelo governo ditatorial de Eduardo dos Santos e seus caciques.
  • Ao discurso do embaixador sobre o governo de Angola não possuir “bola de cristal nem varinha mágica", para controlar bactérias causadoras do surto de febre amarela que presumidamente serão consequências do meio ambiente e do tão afamado el niño – que lata! – João Soares haveria de ter respondido que um governo só é eficiente se as suas instituições se regerem pela antecipação através de cuidados básicos antes do fait accompli e não como instituições reactivas à mortandade.
  • Quando o senhor interino atirou com o livro de Eugénio Rosa sobre o dito estudo macro-económico no qual Portugal tem aparentemente 2.585.970 pessoas a viver no limiar da pobreza; João Soares deveria ter dito que aqueles dados foram obtidos no auge da crise de 2008-2012, logo fora de contexto; e que por sua vez sugeria que se alterassem os índices utilizados para tais cálculos, porque são esses pequenos truques de interesses obscuros que proclamam que países como a China, Rússia, Brasil, África do Sul e Índia são no papel mais avançados que Portugal.
  • O diplomata ao querer refutar a não transparência da reeleição do presidente angolano, no mês passado, porque a votação foi feita electronicamente; João Soares deveria ter lembrado ao seu interlocutor que numa família, grupo, associação e organização existe a intimidação, o aviso de ante-mão, a medida coerciva e preventiva.

A Minha Opinião

Quando Angola diz que não rejubila com, nem publica, manchetes com más notícias sobre Portugal, sou obrigada a veementemente afirmar que o chefe interino da embaixada angolana está a mentir:

  • Nas redes sociais, as tais que o governo de Angola coloca à disposição dos seus cidadãos, quando Portugal estava no auge da crise de 2008-2012 muitos angolanos clamavam que Angola estava a matar a fome aos portugueses e inferioridades que tais (isto é uma repetição do que por mim fora aqui mencionado).

Outro padrão desadequado angolano é aquela estúpida ameaça velada tipo: vejam lá o que dizem porque nós temos em Angola 200.000 portugueses a trabalhar, a vossa balança está equilibrada com a ajuda dos lucros que provêm de Angola - se esta os quiser expulsar faça o favor; lembro-me que no caso BPI, a Isabel dos Santos fez uso dos pulas que operam no seu país e um tal general Bento Kangamba numa frustração também fez uso da mesma lengalenga (talvez para forçar o presidente angolano a ridicularizar-se na cena internacional).

Certos círculos de Angola metem dó, se eu tiver que pagar para ver o bluff angolano, isto é, explicando ao senhor embaixador interino o que representa para Angola a presença dos tais 200.000, isto estará muito mal.

Quanto à acusação de que Portugal sente uma paixão mórbida por Angola, é preciso que alguém esclareça ao Establishment angolano que a morbidez da paixão portuguesa pelo seu parceiro na CPLP e nos PALOPs, é sim uma percepção de Luanda: Veja bem, senhor embaixador interino, a paixão de Portugal por Angola é um acto de puro egoísmo e orgulho nacionais; porque Portugal teme que a comunidade internacional o considere parte de uma comunidade de merda. 

Pronto, caro professor, espero então que se deixe de declarações bombásticas e comece a aplicar a sua tríplice: faça uso da racionalidade (pense e reflicta), razoabilidade (não sinta, concentre-se), e bom senso (pare com o bulldung).

Até para a semana


[As opiniões expressadas nesta publicação são somente aquelas do(s) autor(es) e não reflectem necessariamente o ponto de vista do Dissecting Society (Grupo ao qual o Etnias pertence)]

Comentários

  1. Olá Lenny,

    Como sabes, sou uma daquelas pessoas que começa a pôr em causa a eficácia da democracia liberal. Na minha opinião, a democracia iliberal poderá ser mais prática se o desenvolvimento humano estiver em marcha e a olhos vistos.

    Angola tem um sério problema: finge ter uma democracia liberal e não investe no desenvolvimento humano no angolano comum.

    O presidente dos Santos poderia evitar todas as críticas, na maior parte das vezes bem fundamentadas, se o povo angolano tivesse o mínimo das condições. Por isso, quando Angola acusa Portugal de ter +2 milhões de pobres, ou de pessoas a viver no limiar da pobreza, alguém lhes deveria dizer que pobreza não é miséria.

    O povo angolano vive na miséria abjecta. Os portugueses não.

    Portugal tem escolas públicas, privadas; tem hospitais públicos a dar com o pau (e com muito melhores condições que muitos da Europa, em alguns casos), tem clínicas e hospitais privados, tem transportes públicos, e combate a corrupção abertamente nos dias que correm.

    E Angola?

    Portugal não tem nem metade dos recursos naturais que Angola tem e no entanto faz mais pelo desenvolvimento humano dos portugueses do que a liderança angolana faz pelos seus. Agora imaginem o que os portugueses não fariam se tivessem o petróleo, os diamantes, o gás, os metais etc que Angola possui.

    Bom trabalho, minha cara. Como sempre.

    Beijocas

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    1. Olá, Max!
      O embaixador interino de Angola fez lembrar-me aquele aluno que se ri após saber que chumbou. É inegável que Angola e Moçambique sejam um desastre humanitário; mas os seus líderes argumentarão que a vida dos seus cidadãos é igual a de tantos outros países: os miseráveis, claramente!

      Beijocas

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  2. Os angolanos têm a mania que ninguém pode dizer o que for deles mas na verdade eles querem esconder que o seu país é um país de merda! Essa é que é a verdade, lenny.

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    1. Olá, Anónimo!
      Não sei como é que um esfarrapado, estando em perfeito uso das suas faculdades mentais, pode ter a ilusão de que veste um fato, ainda que tenha sido amanhado pelo alfaiate da esquina do seu bairro social.
      Há coisas que não se entendem....

      Cumprimentos e pbrigada pelo seu comentário, caro Anónimo

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