“Aden está neste momento sob o controle das forças anti-Houthi alinhadas com a coligação militar liderada pelos Sauditas, e o Presidente Iemenita, Abdu Rabbu Mansour Hadi, está alegadamente a planear voltar à cidade no mês que vem, concluindo assim o seu exílio na Arábia Saudita” - Foreign Policy, The Middle East Daily, 21/08/15 (tradução: Max Coutinho)
“Residentes locais afirmaram que, no sábado à noite, militantes da Al-Qaeda obtiveram controle de um distrito ocidental da cidade portuária de Aden, no Iémen.” - Al-Qaida militants take control of Yemen's Aden, raise flag at port, 23/08/15 (tradução: idem)
Na passada sexta-feira, foi reportado que Aden estava sob o controle das forças alinhadas com a Arábia Saudita; porém, no sábado, Aden já estava nas mãos da Al-Qaeda (AQ). Este revés levanta algumas questões: ou a revista Foreign Policy, e outros meios mediáticos, estão a servir de veículo para a desinformação ou a Arábia Saudita fez um acordo com a Al-Qaeda.
Se se verificar a legitimidade dos relatórios dos residentes locais – de que dezenas de militantes da AQ patrulhavam as ruas e içavam a bandeira negra da AQ em edifícios governamentais, em total liberdade; então só nos resta fazer uma pergunta: o que é que aconteceu às forças militares apoiadas pela Arábia Saudita? Estas forças (compostas por +/- 1.000 lealistas Hadi e aliados Iemenitas das forças “Resistência do Sul) alegadamente ajudaram os Emirados Árabes Unidos (EAU) e a Arábia Saudita a colocar cerca de 2.800 tropas em Aden (incluindo Forças Especiais e tropas do exército dos EAU) indicando que, juntos, tinham estado a controlar Aden há mais de um mês – naquilo que foi visto como um enorme golpe contra os Houthis – e agora viemos a saber que num só dia um número humilde de militantes da AQ consegue tomar a cidade das mãos da coligação? Repito: ou há aqui muita desinformação acerca das Operações no Iémen ou as Nações do Golfo acabaram de confessar a sua verdadeira relação com a Al-Qaeda. E se assim foi, o estranho acordo com os iranianos começa a fazer mais sentido.
Não é fora do comum os países fazerem acordos com o diabo – por vezes uma medida política necessária, ainda que arriscada. Não obstante, o que poderá estar a acontecer aqui é que a Arábia Saudita e os seus sócios do Golfo, ao querer proteger os seus interesses no Iémen, podem ter recorrido a uma Grupo Sunita, ainda que uma organização terrorista reconhecida pelo mundo inteiro, para os ajudar a atingir os seus objectivos devido ao seu extenso conhecimento da área e à sua experiência de combate.
A Operação Seta Dourada, no Aden, envolveu landing crafts e navios de guerra anfíbios, brigadas de força operacional da EAU armadas/mecanizadas com “um contigente de tanques e veículos armados de recuperação Leclerc, vários veículos de combate de infantaria BMP-3M, howitzers Denel G6 155mm auto-propulsadas, morteiro auto-propulsado RG-31 Agrab 120mm, e camiões Tatra T816” (fonte); envolveu também 2.800 soldados (colocados no terreno para manejar a artilharia) que não só parecem ter desaparecido como também entregado Aden nas mãos da Al-Qaeda. Porquê?
Um colega nosso contribuiu com uma resposta interessante: os soldados sauditas, incluindo as Forças Especiais, pertencem à Guarda Nacional Saudita, que é o mesmo que dizer que são tropas leais à Monarquia; e a Arábia Saudita tem pouco interesse em mantê-los no Iémen por longos períodos de tempo, sob pena da Família Real ficar vulnerável a ataques domésticos – uma das razões pelas quais o Paquistão foi pressionado a juntar-se à coligação em Abril (antes do Parlamento Paquistanês ter chumbado a proposta).
Não é segredo nenhum que a Irmandade Muçulmana e grupos rebeldes Xiitas são contra as Monarquias do Golfo (a quem os primeiros consideram ilegítimas [por terem sido forjadas por entidades estrangeiras, i.e. A Grã-Bretanha] e cuja opressão Sunita os segundos combatem), logo tentam acabar com o seu reinado a todo o custo. Os Reinos do Golfo estão ao corrente deste facto; portanto, a retirada das suas tropas e a colocação de um outro grupo Sunita, no Aden, para manter os Houthis (apoiados pelo Xiita Irão) afastados dos seus alvos (afim de proteger os Reinos em casa) faz sentido.
Se a Arábia Saudita de facto entregou Aden nas mãos da AQ, isto poderia significar que o Reino Arábico está mais uma vez a usar o grupo Islamista radical para moldar as suas políticas externas; ainda que a explicação oficial que venha a ser dada seja que a decisão foi feita em reacção ao acordo do Irão (código: JCPA, ou seja Joint Comprehensive Plan of Action) – quando na verdade o JCPA foi uma reacção a este tipo de negociatas sauditas com grupos terroristas.
De qualquer maneira, a Arábia Saudita poderá estar a enviar uma mensagem muito interessante - não ao Irão mas – ao Ocidente: o poder iraniano é limitado comparado com o das Nações Árabes do Golfo, já que durante todo este tempo eles conseguiram enganar o mundo debaixo dos seus narizes. Elas criaram grupos como a Al-Qaeda, financiaram-nos, activaram células à volta do mundo e agora, num estalar de dedos, convocam-nos para impedir a expansão iraniana no Médio Oriente. Os eventos reportados - de que a coligação liderada pelos sauditas colocou milhares de tropas em Aden, para depois uns quantos militantes da AQ controlarem a área num total à vontade - servem de suporte à suspeita levantada neste artigo. Se tudo isto não for fruto de desinformação, poder-se-á dizer que decorre uma competição para ver quem é o mais embromador: os Persas ou os Árabes?
A resposta está aí.
Olá, Max!
ResponderEliminarNão me incomodam as patéticas restrições e a ultrajante repressão que os reinos do Golfo infligem sobre as suas populações; pois acho que tenham o direito de fazê-lo visto que, o povo vive todo à pala dos seus governos: se o povo quiser mudar tudo se transformará.
O que tenho contra esses governos do golfo é que permitiram que o mais importante lhes passasse ao lado: relevância geo-política. Deixaram-se cegar pela sua busca de destruir Israel, através do apoio a uma causa furada e financiada com os seus petrodollars.
Os persas viram a oportunidade de preencher a lacuna política e juntaram-se à liga árabe; alinharam na historieta do vamos destruir e aniquilar os judeus da face da terra arábica; fizeram com os árabes continuassem a patrocinar o terrorismo global; amaciaram os paquistaneses e conseguiram umas dicas sobre o fabrico de armas nucleares; esfregaram a sua arrogância na cara dos americanos ao aliar-se à Coreia do Norte para conseguirem mais tecnologia nuclear; fingiram que os russos eram seus conselheiros de eleição; venderam petróleo mais em conta a Índia e China; aliciaram os europeus com negócios volumosos; convenceram os árabes de que o mais importante não era o pan-arabismo mas sim, a exportação da fé muçulmana pelo mundo fora, nem que fosse a ferro e fogo (claro, pago pelos árabes). Estes caíram na esparrela e .... tal qual o controlo da rota da seda, os persas abocanharam o controle do Médio Oriente e proeminência de povo composto, racional e um parceiro com capacidade para o diálogo.
Quando o Irão deu provas de que o Iraque era seu, a Síria era sua, o Hamas e o Hezbollah idem idem aspas e, até começou a ajudar o Ocidente por portas e travessas no combate ao ISIS; os árabes começaram a abrir o olho e estão a ver no engodo em que cairam.
Esta jogada do Iémen é um recado a Europa, EUA e até a Rússia: rapazes basta-nos estalar os dedos e acordaremos os adormecidos como, onde e quando quisermos.
Porém tal jogada de nada valerá até os árabes se compenetrarem no que importa e criarem um bloco juntamente com Israel e o Médio Oriente será uma potência regional que permitirá ocasionalmente o direito de opinião á Turquia e ao Irão, mas não à palavra final.
Boss, bom artigo.
Beijocas
Olá Lenny :D!
EliminarOra, ora...agora é que disseste tudo. O teu comentário é o perfeito complemento ao artigo aqui apresentado, pois captaste a essência do mesmo.
Como diria a nossa editora-chefe: "estes meninos estão a agir conforme o esperado."
Lenny, obrigada pelo teu super comentário :D.
Beijocas
O inimigo do meu inimigo é o meu amigo?
ResponderEliminarOi Cidão :D!
EliminarNeste caso, nem inimigo do inimigo a AQ é, já que esta recebe apoios financeiros tanto de uns como de outros - quando se trata de levar a cabo ataques fora do mundo Islâmico (i.e. contra nós infiéis). Mas se por inimigo queres dizer o "o mundo livre" então a confissão torna-se ainda mais extraordinária.
Obrigada pelo teu comentário, Cid :D.
Um abração